Conteúdo protegido

O conteúdo explanado neste blogue encontra-se protegido. Qualquer uso do conteúdo deve ser autorizado pelo autor para conceder permissão.

Email: helderreis@animasc.com

sábado, 27 de janeiro de 2018

O “aqui”e “agora”, Transferência e Contratransferência

O espaço vivencial no contexto psicoterapêutico foi marcado essencialmente pela relação ausente de julgamentos por parte de quem nos escuta. Modelo de relação que identifico nas palavras de Rogers onde a “preocupação era proporcionar um clima onde se respirasse muita segurança, calor, compreensão por empatia, na medida em que eu pudesse criar com toda a sinceridade. Rogers declara que não considerou “ benéfico nem útil intervir na experiencia do paciente com diagnósticos ou explanações interpretativas ou com sugestões e orientações. Por isso, as tendências a cuja formação assisti partem do próprio paciente, mais do que de mim (Rogers, 2009, p. 199). Analisando e observando alguns aspetos do processo terapêutico, realço que em nenhum momento houve a preocupação etiológica dos meus problemas antes situações actuais e vinculares. Tal como a “observação psicanalítica não se preocupa nem com o que aconteceu, nem com o que vai acontecer, mas com o que está acontecendo.” Wilfred Bion[1]  

Dia penoso!... Estava preocupado com uma questão que me dominava o sono e a vigília. Estava a precisar de uma sessão! No caminho para a sessão, e com o meu coração incompreendido, pressagiei uma dramatização na qual era protagonista (...).

Embora esteja a falar de modelo específico de intervenção/terapia (sociodrama) jamais considero ter uma postura rígida, inflexível e dogmática antes equacionar outras perspectivas de forma a favorecer uma melhor compreensão como por exemplo conceitos psicodinâmicos e humanista.  Reporto este parágrafo do meu diário para fazer a ponte para as questões das transferências e contratransferência, da importância da relação e problematizar estes dois conceitos. Como declara Horacio Etchegoyen na relação terapêutica “existe uma interação que constitui um campo. Portanto, é evidente que os problemas psicopatológicos nem sequer podem ser pensados, exceto através de uma teoria de ligação, uma teoria das relações de objeto, que na teoria psicanalítica se chama teoria de transferência e contratransferência.
Num primeiro momento é necessário entender que o conceito de transferência e contratransferência criado por Freud foi evoluindo ao longo do tempo com novos inputs sendo, também, objeto de críticas por vários estudiosos. Por exemplo, para Klein “a transferência transforma-se num factor intrínseco à análise, dirigida ao objecto. Contrariamente a Freud, para quem a transferência negativa era prejudicial à análise, Klein considerava-a fundamental para se analisarem as partes mais primitivas da mente” (Vicente, 2005, p. 81) Entretanto para Bion[2] “transferência e contra-transferência seriam apenas vínculos de aprisionamento, desde que não apoiados em continente-conteúdo; é este, que lhes vai permitir irem-se transformando. O vínculo em continente é um vínculo de transformação.” (Ibidem) o mesmo autor mais acrescenta que “a cura passa pela busca e pelo amor à verdade, pelo “sê quem és”, pela tolerância à dor mental e, consequentemente, a tolerância à dúvida e ao sentido de infinito” (Ibidem).Sendo a transferência e contratransferência fatores fundamentais para o desenvolvimento do indivíduo sendo perspetivado no modelo de Continente –conteúdo de  Bion.
Para Jacob L. Moreno, pai do psicodrama, parece-lhe “obvio que se os fenómenos de transferência e contratransferência dominam o relacionamento, entre os terapeutas e pacientes, o progresso terapêutico será grandemente prejudicado. O factor decisivo para o progresso terapêutico é a tele[3].”  (Moreno, 1997, p. 44)
Apesar das várias conceções de transferência e contratransferência (e de oposições) é de destacar que qualquer terráqueo humano após o corte do cordão umbilical, que até à data foi importância para o seu desenvolvimento intrauterino, um outro, extremamente necessário, manter-lho-á impercetível ligado à placenta social para que o desenvolvimento siga caminho com, ou sem, determinadas conservas culturais, até a senescência. Reforço a mesma ideia de Macwillims “que somos criaturas inerentemente sociais, que amadurecem numa matriz relacional e precisam de relacionamentos para mudar, é o que sugerem as conclusões empíricas bem fundamentadas de que a aliança entre doente e terapeuta tem muito mais efeito no resultado da terapia do que qualquer outro aspecto do tratamento investigado até agora. E são nestas relações que vamos (re)criando os padrões vinculares e as conservas culturais (...) na realidade uma das suposições básicas diz respeito ao puro poder da relação terapêutica no aqui e agora” (Mcwilliams, 2006, p. 67)

Em suma: os conceitos de transferência e contratransferência foram percecionados  de diferentes formas ao longo do tempo, uns realçando a sua importância, outros negligenciando, ou valorizando outros aspectos, como no caso de Moreno na qual dá ênfase ao conceito tele para o desenvolvimento inter e intrapessoal. Compreendo que partem de estratégias diferentes para atingir um objetivo comum. Mais acrescento, independentemente do caminho que cada um seguir, independentemente do modelo de intervenção, da postura que cada profissional adopte sem duvida que a integração das diferentes abordagens são uma mais mais-valia para intervir com as pessoas invés de para as pessoas dando-lhes oportunidade de serem protagonistas e a autoras da sua própria história de vida.  




[1] Frase estímulo
[2] Para Bion trás uma nova conceção da mente enquanto universo em expansão 
[3] De uma forma genérica a tele é considerada como “a mínima unidade de sentimentos que vai de um indivíduo para o outro” (Abreu, 1992 , p. 99) - à qual  considero  próximo da empatia. 

quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Autoconhecimento, encontro a dois e self

Efetivamente, a relação (psicoterapeuta/diretor e paciente) partiu de condições próximas aos princípios rogerianos, necessárias para qualquer processo terapêutico independente do método, permitindo-me sentir seguro, aceite, compreendido e livre. Marcou-me profundamente a ausência de juízos de valor. Retrato uma situação particular da mesma natureza recorrendo ao meu diário tendo sido o cerne de outras observações e matéria de autorreflexão. Considerando (e ainda reconsidero) aspetos a melhorar quer na minha vida pessoal, social e profissional (uma vez que também trabalho com pessoas) a ausência de julgamentos podendo ter  repercussões na relação:

 “Olhei-me ao espelho! Neste dia acordei com os meus ideais, a minha vontade de explorar a « luz» porém,  dei por mim a fazer juízos de valor fundados em representações mentais. Desejava poder desligar esta “torneira” e não deixar sair mais os meus pré-conceitos. Não os nego, pois sou um ser humano… todavia é importante perceber que os tenho e não deixar influenciar a minha vida. Presenteei isto quando deixei cair um “pingo de água” inconsciente e desloquei-me para o outro com uma representação mental influenciando o meu comportamento (algo do género: - lá vem outro pedir dinheiro! – até gostaria de ver o meu não verbal). Quando o outro apercebeu-se da avaliação errada e a contestou, simultaneamente percebi o meu preconceito sem atender às verdadeiras razões do indivíduo. Nesse dia acordei a minha capacidade de escuta, decidi que é importante apaziguar os meus juízos de valor, as minhas representações mentais e “olhar” para o outro de forma particular e única. Afinal, tal como eu, o outro tem o direito de ser imperfeitamente perfeito”

Este é um exemplo da minha experiência que permitiu-me ganhar consciência de um conjunto de ideias estereotipadas,  preconceituosas bem como sentimentos que tinha em torno de vários “objetos” que inviabilizam a aceitação incondicionável, a empatia impedindo espaço à verdadeira escuta.. Por vezes,  implícita e/ou explicitamente, consciente e/ou inconscientemente, verbal e/ou não verbalmente deixamos cair esses “pingos de àgua” podendo ter repercussões “nefastas” para quem aspira seguir uma carreira profissional na área da Psique (ou qualquer outra cujo objeto de trabalho são pessoas) e para quem procura ajuda. Enquanto educador social e  aspirante de psicólogo, e quem sabe de psicoterapeuta, é francamente pertinente este nível de autoconhecimento e apesar parecer de fácil controlo em contextos reais  facilmente transparece. Os sentimentos só se tornam conhecidos quando deles temos conhecimento. “Quanto mais (...) souber ouvir e aceitar o que se passa em si mesmo, quanto mais souber ser a complexidade dos seus sentimentos, sem receio, maior será o seu grau de congruência.” (Rogers, 2009, p. 89) Toda esta questão de autoconhecimento não nega os sentimentos até, como afirma Mcwilliams, “parece-me que é de uma subtil desonestidade actuar como fôssemos «vazios» quando, na verdade, estamos cheios de sentimentos, e quando uma reação mais franca do que essa putativa neutralidade até aprofunda muitas vezes o trabalho.” (Mcwilliams, 2006, p. 207 )Porém, a consciência dos nossos sentimentos ajuda a dar respostas mais adequadas à situação para que o terapeuta/profissional tenha"uma atitude que evitará ou reduzirá os sentimentos de vergonha e humilhação sobre o que quer que seja revelado." (Mcwilliams, 2006, p.160)

O autoconhecimento vai para além da nossa consciência e como afirma Jung “confundimos «autoconhecimento» com o conhecimento da personalidade consciente do eu (...) O homem mede o seu conhecimento através daquilo que o meio social sabe normalmente a seu respeito e não a partir do facto psíquico real que, na maior parte das vezes, lhe é desconhecido” (Jung, 1991, p. 3).
Se o autoconhecimento subentende-se o conhecimento de si próprio logo obriga-nos a equacionar e explorar o conceito de Self. Apesar das quatro letras este conceito é muito mais complexo “basta ter em conta a lista de trabalhos em que o self aparece como prefixo, como por exemplo: self-awereness (autoconsciência), self-concept (auto-conceito), self-control (autocontrolo) self-disclosure (auto-revelação) self-efficacy (auto-eficácia) self-esteem (auto-estima), self- image (auto-imagem) ...” (Neto, 1998, p. 140)
Diversas definições de self coexistem nas teorias e práticas psicológicas, por exemplo: “Guanaes e Japur (2003 cit in Macedo & Silveira, 2012, p. 284) examinaram as descrições para o self nas principais teorias psicanalíticas: psicologia do ego, teoria das relações objetais e psicologia do self. O conceito de self pode ter o sentido de Ego, como estrutura mental, e também indicar o self como experiência subjetiva individual de si mesmo. Existem, portanto, fronteiras claras entre mundo interno e externo, e o self se constitui como uma entidade pontual nesta relação.”
O humanismo, alimentado pelos movimentos fenomenológicos e existêncialistas, dá enfase às capacidades do ser humano. Rogers (s/d) apresentou “uma compreensão de self como um elemento fundamental da experiência do sujeito e um aspecto central da personalidade Trata-se de um conceito fenomenológico de self, ou seja, um padrão de percepções conscientes que o indivíduo experiencia. Um conceito de self que enfatiza aspectos de caráter único e específico, e que busca padrões estáveis no tempo” (Macedo & Silveira, 2012, p. 284) Mais acrescenta que a qualidade do self é um produto social e desenvolve-se mas relações interpessoais.
Segundo a Gestalt “O self é nossa essência; é o processo de avaliar as possibilidades no campo, integrá-las e levá-las à completude em função das necessidades do organismo. O self é o agente em contato com o presente, efetuando o ajustamento criativo, fazendo sentido. O self constitui nossos processos saudáveis, funcionando para a existência e crescimento do organismo. (Latner, 1973, p.4  cit in Frazão, 1995, p. 147)[1]
Apesar das várias teorias existentes e a sua complexidade poderemos integrar as diferentes abordagens sem anular a sua singularidade. Realço a metáfora de Cooley que serve analogia para melhor compreensão do self. O self “que se olha ao espelho, para ilustrar a ideia de que o senso do self individual é, inicialmente, formado a partir de suas perceções sobre como os outros percebem. Assim as reações dos outros funcionam como reflexos de um espelho fornecendo informações que o indivíduo utiliza para construir seu senso do self. (Macedo & Silveira, 2012, p. 285)[2].
Em boa verdade, “Sempre que duas pessoas se encontram, existem, na realidade, seis pessoas presentes. Existe cada indivíduo da maneira como ele vê a si próprio; cada indivíduo da maneira como ele é visto pelo outro e cada indivíduo como ele realmente é.” (William James)[3]
Reporto-me para um excerto do meu diário retratando uma situação que “ruminava” o meu pensamento - quem eu era realmente?

 A alma sente mas existe algo que abafa o bater dos meus sentimentos. A noite distorce a sombra do meu ser. Serei mais racional ou emotivo?”
 (...)“ Talvez seja do género…da educação… «Um homem não chora» assim dizia o meu avô. A um homem não é permitido muita coisa... tem que ser uma figura forte e rígida. Os outros dizem: - Abafa o choro, fecha as tuas emoções, não mostres os teus afectos pois isso são de seres que não são homens… e também não são mulheres! E assim fui crescendo e assim me fizeram… (Foram eles que bloquearam alguns dos meus sentires!).Mostraram-me que um homem deve exibir somente algumas emoções que espelham a fúria, os nervos, raiva, a agressividade… será que ao momento da minha vida eu compreendi estas minhas emoções? Será que usei a minha razão? Ou simplesmente abafei alguns sentimentos, em detrimento de outros, sem saber a verdadeira razão de ser? Sou simplesmente um produto de filhos que por sua vez são filhos que retroalimentam toda uma conserva cultural. Uma oportunidade de transformação!? Será que devo ser um eterno fingidor? O que faço aos meus afectos e emoções que deveria esconder? Se tiver vontade de mostrar? …porque não? (Claro que tudo depende da situação!) E como fica o meu estatuto de homem?... Prefiro deixar de ser homem e digam simplesmente que sou uma pessoa. E o que fazer relativamente às emoções como a raiva? Se estiver furioso? Existe algo entre a emoção e a acção … porque não pensar antes de agir? Porque não manifestar simbolicamente, com as palavras, como me sinto?
By me : Hélder Reis 

Com esta reflexão consegue-se compreender a relação interativa entre o meio externo e o meio interno, do campo interpessoal para o intrapessoal, a construção do self numa fase precoce do desenvolvimento e o trama das emoções que não podiam ser manifestadas em detrimento de outras. Por outro lado, eu era o que as pessoas mais próximas queriam que fosse e, na necessidade de ser aceite, acabei por me conformar. Com receio eu era aquilo que não queria ser que progressivamente definiu-me o que era.   Em suma, não estava a ser congruente e não estava a ser o que realmente queria ser. Via-me como um ser agressivo, outros olhavam para mim como um verdadeiro “Homem” e a insegurança dominava o que realmente era. Foi no “aqui” e no “agora” (presente do meu passado) que tive a oportunidade de me reencontrar e de (re)criar um novo papel  desenvolvendo a confiança necessária para crescer e evoluir. Parafraseando Rogers, que  melhor expressa a abertura de um novo caminho  na medida em que “o movimento caracaterístico do paciente é o que lhe permite ser ele mesmo livremente, no processo instável e fluido que ele é. Ele encaminha-se para uma abertura favorável ao que nele se passa – aprendendo a ouvir-se a si mesmo sensivelmente. Isto significa que é cada vez mais uma harmonia de sensações e de reações complexas, em vez da clareza e da simplicidade da rigidez, ou seja, que caminha para a aceitação da sua «essência», aceitando os outros, de um modo mais atento e compreensivo” (Rogers, 2009, p. 214)

Nascemos seres humanos e tornamo-nos pessoas com o processo de socialização e em coautoria, entre o “eu” e o “tu”, desenvolvemo-nos. Nem sempre temos a consciência de quem realmente somos, o que realmente queremos e qual o caminho pretendido mas é entre a razão e a emoção que percebemos realmente o que desejamos entre os múltiplos trilhos sociais subtilmente induzidos.







[1] Pode ser consultado no link: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-51771995000200011
[2] Pode ser consultado no seguinte link: http://www.scielo.br/pdf/paideia/v22n52/14.pdf
[3] Frase estímulo fornecido pelo docente para a construção deste trabalho

Jung, C. G. (1991). Presente e Futuro (3ª Edição ed.). Brasil: Editora Vozes Ldª.
Mcwilliams, N. (2006). Psicoterapia Psicanalítica (1ª Edição ed.). Lisboa: Climepsi

Rogers, C. (2009). Tornar-se Pessoa. Lisboa: Padrões Culturais Editora.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Curso Psicodança

A Psicodança como método de intervenção terapêutica, psicopedagógica e social


Estão abertas as inscrições para o Worshop de Psicodança: A Psicodança como método de intervenção, a decorrer nos dias 3 e 4 de fevereiro de 2018, entre as 9.30h e as 19.30h, na ESE/IPP, sob orientação da Drª. Amelia Coppel - Diretora de Psicodrama e de Psicodança na Escola do Dr. Rojas-Bermudez - e do Dr. Gonzalo Negreira - Ego-auxiliar de Psicodança e de Psicodrama na Escola do Dr. Rojas-Bermudez

para mais informações contacte: sofiaveiga@ese.ipp.pt

retirado do site: https://www.ese.ipp.pt/noticias/psicodanca-como-metodo-de-intervencao-terapeutica-psicopedagogica-e-social