O espaço vivencial no contexto
psicoterapêutico foi marcado essencialmente pela relação ausente de
julgamentos por parte de quem nos escuta. Modelo de relação que identifico nas
palavras de Rogers onde a “preocupação era proporcionar um clima onde se
respirasse muita segurança, calor, compreensão por empatia, na medida em que eu
pudesse criar com toda a sinceridade. Rogers declara que não considerou “
benéfico nem útil intervir na experiencia do paciente com diagnósticos ou
explanações interpretativas ou com sugestões e orientações. Por isso, as
tendências a cuja formação assisti partem do próprio paciente, mais do que de
mim (Rogers, 2009,
p. 199) .
Analisando e observando alguns aspetos do processo terapêutico, realço que em
nenhum momento houve a preocupação etiológica dos meus problemas antes
situações actuais e vinculares. Tal como a “observação
psicanalítica não se preocupa nem com o que aconteceu, nem com o que vai
acontecer, mas com o que está acontecendo.” Wilfred Bion[1]
Dia penoso!... Estava
preocupado com uma questão que me dominava o sono e a vigília. Estava a
precisar de uma sessão! No caminho para a sessão, e com o meu coração
incompreendido, pressagiei uma dramatização na qual era protagonista (...).
Embora esteja a falar de modelo específico de intervenção/terapia (sociodrama) jamais considero ter uma postura rígida, inflexível e dogmática antes equacionar outras perspectivas de forma a favorecer uma melhor compreensão como por exemplo conceitos psicodinâmicos e humanista. Reporto este parágrafo do meu diário para
fazer a ponte para as questões das transferências e contratransferência, da importância da relação e
problematizar estes dois conceitos. Como declara Horacio Etchegoyen na relação terapêutica “existe uma interação que
constitui um campo. Portanto, é evidente que os problemas psicopatológicos nem
sequer podem ser pensados, exceto através de uma teoria de ligação, uma teoria
das relações de objeto, que na teoria psicanalítica se chama teoria de
transferência e contratransferência.
Num primeiro momento é
necessário entender que o conceito de transferência e contratransferência
criado por Freud foi evoluindo ao longo do tempo com novos inputs sendo, também, objeto de críticas por vários estudiosos. Por
exemplo, para Klein “a transferência transforma-se num factor intrínseco à
análise, dirigida ao objecto. Contrariamente a Freud, para quem a transferência
negativa era prejudicial à análise, Klein considerava-a fundamental para se
analisarem as partes mais primitivas da mente” (Vicente, 2005, p. 81) Entretanto para Bion[2]
“transferência e contra-transferência seriam apenas vínculos de aprisionamento,
desde que não apoiados em continente-conteúdo; é este, que lhes vai permitir
irem-se transformando. O vínculo em continente é um vínculo de transformação.”
(Ibidem) o mesmo autor mais acrescenta que “a cura passa pela busca e pelo amor
à verdade, pelo “sê quem és”, pela tolerância à dor mental e, consequentemente,
a tolerância à dúvida e ao sentido de infinito” (Ibidem).Sendo a transferência
e contratransferência fatores fundamentais para o desenvolvimento do indivíduo
sendo perspetivado no modelo de Continente –conteúdo de Bion.
Para Jacob L. Moreno, pai do
psicodrama, parece-lhe “obvio que se os fenómenos de transferência e
contratransferência dominam o relacionamento, entre os terapeutas e pacientes,
o progresso terapêutico será grandemente prejudicado. O factor decisivo para o
progresso terapêutico é a tele[3].” (Moreno, 1997, p. 44)
Apesar das várias conceções de
transferência e contratransferência (e de oposições) é de destacar que qualquer
terráqueo humano após o corte do cordão umbilical, que até à data foi
importância para o seu desenvolvimento intrauterino, um outro, extremamente
necessário, manter-lho-á impercetível ligado à placenta social para que o
desenvolvimento siga caminho com, ou sem, determinadas conservas culturais, até a senescência.
Reforço a mesma ideia de Macwillims “que somos criaturas inerentemente sociais,
que amadurecem numa matriz relacional e precisam de relacionamentos para mudar,
é o que sugerem as conclusões empíricas bem fundamentadas de que a aliança
entre doente e terapeuta tem muito mais efeito no resultado da terapia do que
qualquer outro aspecto do tratamento investigado até agora. E são nestas
relações que vamos (re)criando os padrões vinculares e as conservas culturais (...)
na realidade uma das suposições básicas diz respeito ao puro poder da relação
terapêutica no aqui e agora” (Mcwilliams, 2006, p. 67)
Em suma: os conceitos de
transferência e contratransferência foram percecionados de diferentes formas ao longo do tempo, uns
realçando a sua importância, outros negligenciando, ou valorizando outros aspectos, como no caso de Moreno na qual dá ênfase ao conceito tele para o desenvolvimento inter e intrapessoal. Compreendo
que partem de estratégias diferentes para atingir um objetivo comum. Mais acrescento,
independentemente do caminho que cada um seguir, independentemente do modelo de intervenção, da postura que cada profissional adopte sem duvida que a integração das diferentes abordagens são uma mais mais-valia para intervir com as pessoas invés de para as pessoas dando-lhes oportunidade
de serem protagonistas e a autoras da sua própria história de vida.
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